Lucas, meu personagem em "Solo", assim pensava dos sábados: "Assim vamos, iluminados pelos tubos catódicos. Noite de sábado é como uma fogueira extinta. Revolvo as cinzas. Dá para ouvir algum ruído vindo de um mundo em festa. Jovens avançam para o escuro das boates. Carros zunem na avenida em repouso. Há tesão no ar. Em casa, o tempo equilibra-se numa placa de concreto desarmado. A vida, já disse, tem algo de Fórmula 1. Já saiu a ordem de largada. A pole tem dono. Quase sempre os mesmos. Só restaria aos demais saber desistir da corrida. Jogar outro jogo. Brincar de outra coisa. Dar o fora. Mas os retardatários são os mais insistentes. Observo-os tomando volta depois de volta e arrastando-se na pista, lentos, tristes, perdendo os pedaços, esperançosos. Incorrigíveis. Na televisão, nunca existem perdedores. Tudo é lúdico, didático e positivo. Na Globo, o Ministério da Saúde me adverte dos perigos do cigarro. Provoca câncer de tudo. Agradeço. Não fumo. Todo mundo se lixa para a morte lenta. Na MTV, aprendo, muito bacana, na linguagem da galera, tudo sobre o uso de camisinha. Agradeço. Não trepo. Ninguém se importa com a morte rápida. Curto a estética hip-hop num programa da MTV. Maneiro. O pessoal manda bem um ritmo alucinante e descolado. Vou tentar me vestir como eles, um dia. Juro. Pena que a vadia da Irene não tenha tido tempo de revolucionar a minha cabeça. Eu só queria trocar o divã pela cama. Ela não entendeu. A televisão é a minha prostituta predileta. Uma cadela refestelada. Me dá tudo o que preciso para me ralar sozinho. Não pede nada. Mas eu lhe dou a minha alma. Vemos no GNT uma reportagem sobre previsão do futuro com lascas de unhas. Depois, já na madrugada, em outro canal, um especial sobre vidas passadas”. Lucas não é uma boa referência. É um pessimista. Neste domingo, Rubinho Barrichelo vencerá e redimirá todos os retardários. Assim seja!
Juremir Machado da Silva - 17/10/2009 - Colunista do Jornal Correio do Povo
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