A comissão terá como objetivo esclarecer os casos de violação de direitos humanos ocorridos entre 1946 e 1988, o que inclui o período da ditadura militar
REDAÇÃO ÉPOCA, COM AGÊNCIAS
A presidente Dilma Rousseff sancionou na manhã desta sexta-feira, dia 18, a lei que cria a Comissão da Verdade para apurar violações aos direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988, período que inclui a ditadura militar. Dilma sancionou também a Lei de Acesso a Informações Públicas, que acaba com o sigilo eterno de documentos.
A cerimônia, marcada para 10h30, teve atraso de mais de uma hora. O único a discursar foi o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. “A questão dos direitos humanos é chave e, portanto, a lei [de Acesso a Informações Públicas] foi clara. Nesse segmento não há restrições de informação", disse.
O projeto de lei que cria a Comissão Nacional da Verdade foi enviado para sanção de Dilma depois de aprovado na Câmara e no Senado. A comissão terá como objetivo esclarecer os casos de violação de direitos humanos ocorridos entre 1946 e 1988, o que inclui o período da ditadura militar. Mesmo sem o poder de abrir processos, a Comissão da Verdade deve trazer momentos dolorosos e polêmicas à tona. Ela poderá ordenar diligências e perícias, além de pedir informações, dados e documentos de quaisquer órgãos e entidades do poder público, como as Forças Armadas, mesmo se classificados com o mais alto grau de sigilo.
O texto foi aprovado de forma simbólica após acordo entre os líderes partidários, motivado pela pressão feita pelo Palácio do Planalto. O governo só conseguiu o apoio das Forças Armadas ao estabelecimento da Comissão da Verdade pois o projeto prevê que não haverá punições aos autores de crimes como tortura e assassinato. É isto que determina a Lei da Anistia, condenada pela Comissão de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), mas ratificada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O relator do texto no Senado, Aloysio Nunes Ferreira, do PSDB de São Paulo, que participou da luta armada durante o regime militar (1964-1985), afirmou, em entrevista a ÉPOCA em outubro, que a comissão não deve ter limites. "Deve-se examinar esse passado sem restrição, sem medo. É um período de esforço concentrado para buscar resolver questões que as investigações anteriores não conseguiram desvendar. Essa busca não vai ser concluída pela formulação de uma verdade oficial. Acho que ela vai contribuir para a história se conseguir abrir dossiês que continuam envoltos num mistério", disse Aloysio Nunes Ferreira.
Depois de instalada, a comissão terá dois anos para funcionar e verba própria. Os sete integrantes da comissão serão nomeados pela presidente e não podem ser membros de comitês executivos de partidos políticos e nem ter cargos comissionados no governo. Eles terão salários de cerca de R$ 11 mil.
O líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), que atuou de forma intensa nas negociações para a aprovação da Comissão da Verdade, disse que o objetivo foi produzir um texto que garantisse o conteúdo da comissão, que “é esclarecer os fatos e, após os esclarecimentos desses fatos, não terá nenhuma perseguição e nenhum desdobramento judicial. O intuito é do esclarecimento”, disse. Essa era uma preocupação do governo, uma vez que o acerto político feito com os comandantes das Forças Armadas previa que a Comissão da Verdade não confrontaria a Lei da Anistia.
A Comissão da Verdade será composta de sete membros indicados pela presidente da República, Dilma Rousseff, entre brasileiros de "reconhecida idoneidade e conduta ética, identificados com a defesa da democracia e institucionalidade constitucional, bem como com o respeito aos direitos humanos". Os membros da comissão serão designados com mandato de duração até o término dos trabalhos da comissão, a qual será considerada extinta após a publicação do relatório final.
Na votação na Câmara, em setembro, os deputados aprovaram dispositivo do PPS que determina o envio de todo o acervo apurado ao Arquivo Nacional. Os deputados rejeitaram destaque apresentado pelo deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que proibia a denúncia criminal ou aplicação de sanção punitiva de qualquer tipo aos militares que se recusarem a colaborar com a Comissão da Verdade.
Bolsonaro fez campanha contra a instalação da comissão, alegando que ela era uma tentativa de criar revanchismo na sociedade brasileira. “Não há dúvida que é a comissão da revanche, porque aqui tudo é impositivo, inclusive eles têm o poder de buscar documentos na casa de quem quer que seja. Vão meter o pé na porta de casas de velhos generais e velhos coronéis para tirar de dentro o que bem entender, sem autorização judicial, inclusive.", afirmou o deputado carioca.
A insatisfação com a Comissão não é unanimidade entre os militares. O Major-Brigadeiro-do-Ar Rui Moreira Lima, de 92 anos, detentor da segunda maior patente da Aeronáutica e herói da Segunda Guerra Mundial, chama a campanha contra a Comissão da Verdade de "corporativismo burro" e defende, inclusive, que seja revista a Lei de Anistia. "O mundo inteiro está acabando com isso. Estão mandando os torturadores e matadores para a cadeia. Eu não sou revanchista. Não tem revanche nenhuma", afirmou Rui Moreira Lima à ÉPOCA.
Nenhum comentário:
Postar um comentário