CONTRA A PRIVATIZAÇAO DAS PRISÕES:
O povo gaúcho não quer mais do mesmo!
"Um filósofo produz idéias, um poeta poemas, um pastor sermões, um professor tratados etc. Um criminoso produz crimes [...]. O criminoso não produz somente crimes, ele produz também o Direito Penal e, em conseqüência, também o professor que produz cursos de Direito Penal e, além disso, o inevitável tratado no qual este mesmo professor lança no mercado geral suas aulas como ‘mercadorias’. [...] O criminoso produz, além disso, toda a polícia e toda a justiça penal, os beleguins, juízes, carrascos, jurados etc. [...] Enquanto o crime retira uma parte da população supérflua do mercado de trabalho e assim reduz a competição entre os trabalhadores [...] a luta contra o crime absorve outra parcela dessa mesma população [...]. O crime, pelos meios sempre renovados de ataque à propriedade, dá origem a métodos sempre renovados de defendê-la e, de imediato, sua influência na produção de máquinas é tão produtiva quanto as greves"
Karl MARX. Teorias da Mais-Valia.
Trad. Vinicius Caldeira Brant em O Trabalho Encarcerado (1994, p. 31 e 36).
A proposta do governo do Estado do Rio Grande do Sul de privatizar o sistema prisional através de Parcerias Público-Privado para a construção e administração de novos presídios, saudada com loas por setores da sociedade gaúcha, não traz nada de novo. Aliás, é mais uma proposta do “tipo antigo”, repetindo a mesmice da cantilena que diz que se o setor público não resolve, basta entregar ao setor privado que, este sim, sabe o que fazer. É mais uma versão do neoconservadorismo que tem se espraiado pelo mundo, mesmo que já tenha se esboroado – basta olhar para a crise financeira e as soluções que são apresentadas para ela pelos governos dos países mais ricos.
É de conhecimento público que o sistema prisional está falido na sua função social de ressocialização. Nem a hipocrisia mais leviana consegue sustentar a máscara. Os presídios converteram-se, sim, e desde há muito, no que os velhos liberais e os novos conservadores já esperavam deles, locais para esconder o que é perigoso aos bons contratos sociais, só, nada mais! É também de conhecimento público que o Rio Grande do Sul ostenta um título nacional ultra-negativo: tem em seu território a penitenciária que apresenta as piores condições, o Presídio Central, conforme revelou a recentemente encerrada CPI do Sistema Prisional. É também conhecida a falta de ação do governo estadual para viabilizar a construção de novas unidades prisionais para fazer frente à superlotação, algumas das quais inclusive já contam com recursos disponibilizados, como é o caso do novo presídio de Passo Fundo, para citar somente um exemplo. Definitivamente, parece que o Estado do Rio Grande do Sul não tem uma política prisional. Poder-se-ia até dizer que o anúncio da privatização dos presídios soaria como declaração pública da ausência desta política. O fato é que, pelo contrário, o governo do Estado finalmente encontrou uma política para a questão prisional, abster-se de fazer política pública, entregar a responsabilidade pública à iniciativa privada.
A proposta não é nova, mesmo que venha sendo saudada inclusive por veículos de imprensa de ampla repercussão. Ela tem um DNA conhecido. Foi proposta no início dos anos 1980 pelos governos Thatcher e Reagan – quem não se lembra deles, pai e mãe das políticas neoliberais. Já foram largamente implantadas em vários países e inclusive em alguns Estados brasileiros. É uma proposta velha, no pior sentido do termo, do velho tipo! Aliás, já foi discutida inclusive no âmbito do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), órgão do Ministério da Justiça encarregado da formulação de linhas diretrizes para a área, que propôs a adoção das prisões privadas no Brasil em janeiro de 1992 – tempos áureos do neoliberalismo. Laurindo Dias Minhoto alerta que, no Brasil, a proposta de privatização do sistema prisional “[...] resulta de um intenso lobby realizado por uma empresa brasileira de segurança privada, a Pires Segurança Ltda., destinado a transpor as prisões privadas para o contexto brasileiro, a partir da manipulação seletiva da ‘experiência estrangeira’ – sobretudo da experiência norteamericana – invocada como argumento de autoridade (Privatização de presídios e criminalidade. A gestão da violência no capitalismo global. São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 92).
José Eduardo Cardozo, no Prefácio ao livro de Minhoto já referido (2000, p. 13) diz enfaticamente que: “Nesse contexto de reestruturação econômica, portanto, em cujo âmbito o mercado é quem passa a comandar o jogo, o acesso aos serviços essenciais não depende mais de políticas governamentais, mas de contratos privados de compra e venda firmados com base no que os consumidores podem ou estão dispostos a pagar numa troca livre. Desse modo, o que era basicamente um tema de direitos humanos ou de direitos sociais é convertido numa questão de caráter meramente mercantil. Aprofundando o argumento: tudo – trabalho, terra e até seres humanos – acaba sendo reduzido ao conceito geral de mercadoria. Inclusive aqueles que, por terem transgredido as leis penais, foram condenados pela justiça”. Aliás, as palavras de Thomas Beasley, sócio fundador da privatização ilustram o que diz Cardozo e falam por si: “[...] a Corrections Corporation of America [CCA] foi estabelecida em 1983 para ‘resolver a questão penitenciária e fazer um bom dinheiro’” A empresa, segundo seu catálogo promocional, propõe-se a: “aliar os padrões mais elevados da penitenciária aos princípios comprovados da livre iniciativa” (citado por Mignoto em As prisões do mercado (Revista Lua Nova, n. 55-56, 2002).
Segundo Minhoto, em artigo já referido (2002): “[...] o experimento concreto norte-americano e britânico tem demonstrado que as prisões privadas não vêm prestando serviços necessariamente mais baratos nem tampouco mais eficientes, reproduzindo os problemas estruturais que atravessam o sistema penitenciário público tradicional. Uma longa lista de práticas ineptas pode ser detectada nos dois contextos”. Ele também alerta que a “[...] reedição high-tech do panopticon benthamiano, sob o acicate da lógica da mercadoria, tende a colocar em questão alguns dos traços centrais do Estado de Direito, tais como o monopólio estatal do uso legítimo da força e o fundamento eminentemente público do poder nos regimes democráticos, dando lugar a objeções de ordem jurídica, política, ética e simbólica”. Ora, por que achar que o que não deu certo lá pode dar certo aqui!
Assim, o Movimento Nacional de Direitos Humanos no Rio Grande do Sul (MNDH-RS) manifesta seu repúdio à proposta de privatização do sistema prisional, conclama à sociedade e suas organizações democráticas a se manifestar contra a proposta, cobra das autoridades encarregadas de promover o Estado Democrático de Direito que também reajam ao descabido da proposta e espera que o governo estadual apresente uma proposta consistente, permanente e de caráter efetivamente público para fazer frente à grave crise do sistema prisional. O MNDH-RS não quer mais do mesmo!
Porto Alegre, 20 de março de 2009.
Coordenação Estadual do MNDH-RS
Acho que falta um pouco de conhecimento por parte d quem escreveu esse texto.
ResponderExcluirSó pela introdução, o texto já se mostra incoerente.
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