terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Direito à memória e a verdade

Muito se tem falado sobre tortura ultimamente, e a Lei da Anistia, de 1979, está de volta à agenda pública. Esta tem sido evocada por integrantes do Governo Federal que entendem que o crime de tortura é imprescritível, e portanto, torturadores não podem ser considerados anistiados pelo que promoveram e executaram nos duros anos de chumbo.
Um episódio emblemático é a luta judicial que a família Teles, casal e dois filhos (que eram pequenos à época em que os pais foram submetidos a tortura por serem opositores do regime), moveu contra o coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, que comandou o DOI-Codi de São Paulo entre 1970 e 1974. O coronel foi declarado torturador publicamente.
Presenciei, certa vez, uma audiência da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, dentro da Caravana da Anistia, que declarou anistiado Flávio Koutzii, ex-deputado estadual e dirigente do PT do Rio Grande do Sul.
Tive a felicidade de estar em Caxias do Sul naquele 17 de julho. O auditório “improvisado” no ginásio da Universidade estava lotado por estudantes de Direito do Brasil inteiro e militantes gaúchos que se dirigiram até lá para acompanhar a audiência. Um dos casos a serem apreciados seria o do ex-deputado, muito conhecido no estado e respeitado pelo seu histórico de lutas em defesa do povo, da liberdade, do socialismo. Um grande militante.
A comissão relatou o caso de Koutzii, e, em seguida, homenageou, na pessoa dele (foi assim que entendi) todos aqueles grandes homens e grandes mulheres que dedicaram sua juventude e sua vida a enfrentar o autoritarismo dos que negam ao povo o direito à igualdade. Muitos tombaram. Muitos desistiram. E muitos aqui estão para contar essa história, e mais do que isso, para continuar escrevendo-a. Koutzii é um desses.
Koutzii se emocionou quando teve direito à palavra. Homenageou seus companheiros e companheiras, reafirmou os ideais que o moveram naquele período, e que fazem sentido até hoje, garantindo sua militância. Ao final de um belo discurso que declarou Koutzii anistiado, o presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, falou isso: “O Estado brasileiro lhe pede desculpas”.
Eu me emocionei umas 10 vezes ao assistir aquilo. Mas até hoje eu me arrepio ao lembrar dessa frase. “O Estado brasileiro lhe pede desculpas”. Por tê-lo torturado, por ter-lhe roubado preciosos anos de sua juventude, por ter-lhe caçado o direito à voz, ao exercício pleno de seus direitos – e à luta plena para que eles sejam ampliados até que exista igualdade, democracia e justiça de verdade. Flávio Koutzii é um grande homem. Sinto-me honrada fazer parte do mesmo partido que ele ajudou a fundar e onde milita até hoje, apesar dos percalços e da vontade de desistir que sempre vem. E sempre é superada. Porque, desculpem a pieguice, mas a esperança equilibrista sabe que o show de todo artista tem que continuar. E ela ainda tem muito o que fazer por aqui.
Koutzii sinônimo de luta pela democrácia.
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Contribuição feita por Alessandra Terribili

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